A REVOLTA DOS ALFAIATES (Verbete)

Diferente da inconfidência mineira, que contava com um setor social mais elitista, a “Revolta dos Alfaiates” (também chamada de “conjuração baiana”), em Salvador, contou com uma ampla adesão popular, além de classes médias e profissionais liberais (professores, advogados, alguns jornalistas e pequenos proprietários, em sua maioria mestiços). O nome de “revolta dos alfaiates”, já denota a presença popular de setores e classes mais pobres.

Tudo começou quando na noite do dia 11 para 12 de agosto (de 1798) panfletos manuscritos foram fixados em postes e muros dos lugares mais movimentados da cidade de Salvador. Este documento era o “Manifesto ao Povo Baiense” e dizia: “o Poderoso e Magnífico Povo Baiense Republicano desta cidade, considerando nos muitos e repetidos latrocínios feitos com os títulos de impostura, tributos e direitos que são cobrados por ordem da Rainha de Lisboa, e no respeita a inutilidade da escravidão do mesmo povo tão sagrado e digno de ser livre, com respeito a liberdade e igualdade, ordena, manda e quer que para o futuro seja feito nesta cidade e seu termo a sua revolução para que seja exterminado para sempre o péssimo jugo reinável da Europa”.

Os “conjurados”, pelo trecho acima, queriam mais do que a separação de Portugal, queriam a república, o fim imediato da escravidão e liberdade de comércio. Uma inspiração da Revolução Francesa, que começava a declinar na Europa mas ainda exercia uma forte influência nas ideias políticas mais radicais. Os revoltosos da Bahia, se organizaram secretamente e contaram com a participação de uma loja maçônica, os “cavaleiros da luz” (um nome bem apropriado para entusiastas do iluminismo).

Enforcamento, em novembro de 1799, dos conjurados Lucas Dantas, Manuel faustino, João de Deus e Luís Gonzaga.

Principalmente após a transferência da capital do Brasil de Salvador para o Rio de Janeiro (em 1764) a velha oligarquia açucareira perdeu parte de seu poder frente a Coroa. Mas justamente após esta mudança, o preço do açúcar no mercado mundial teve um aumento. Muitos proprietários viram a oportunidade de elevar suas rendas e deixaram de produzir gêneros alimentícios e passaram a produzir açúcar. O resultado foi que em 1797 a escassez de alimentos era crônica nas cidades, principalmente em Salvador. Só os mais ricos tinham condições de trazer alimentos de fora. A fome era um elemento a mais para que o povo se revoltassem.

No mesmo dia 12, a polícia arranca dos postes e muros o Manifesto e sai à caça dos responsáveis. Um soldado chamado Luís Gonzaga das Virgens (1763-1799) é preso, acusado de ter a mesma caligrafia dos papéis. Casas são invadidas e mais pessoas são presas, como o alfaiate Lucas Dantas (1775-1799). Ao todo são indiciados 34 réus, dentre os quais 1 negro escravo. O médico Cipriano Barata (1762-1838) também esta indiciado, sua figura terá, até o dia de sua morte, uma grande participação entre vários movimentos sociais ocorridos no Brasil, o que lhe dá a alcunha de “revolucionário de todas as revoluções”. Preso diversas vezes, Barata representa o fator radical e liberal das revoluções que participou.

Praça da Piedade, local da execução dos conjurados.
Assim como a inconfidência mineira, a revolta dos alfaiates teve gente que foi punida, para “servir de exemplo”, evitando novos “atos de rebeldia”. Quatro presos foram enforcados em praça pública. Sem dúvida o conteúdo social da conjuração baiana era mais radical que a mineira, a abolição da escravidão – numa época em que o Haiti estava em luta para assegurar a igualdade dos negros – era um perigo para o senhores de escravos, que eram os donos do poder local.

Talvez por sua radicalidade, a revolta dos alfaiates não mereceu uma data comemorativa e seja pouco lembrada nos dias de hoje, diferente da moderada inconfidência mineira.




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Sobre o Autor:
Fábio Melo
Fábio Melo. Membro Permanente e fundador do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata. Pesquisa sobre História Social da América e Educação na América (América Latina e Estados Unidos). Produtor e radialista do programa "História em Pauta" na rádio La Integracion. Tem diversos textos escritos sobre educação, cultura e política. 

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