Formado em Comunicação pela FAAP – Fundação Armando Penteado e autodidata em Teoria Política. Atua na área de criação e planejamento publicitário e gestão de empresas. É sócio da FCP Publicidade e participa da diretoria do Beira Rio Supermercado em Gurupi – TO. Mantém o blog www.questoesrelevantes.wordpress.com majoritariamente focado em teoria política e sua relação com o cotidiano fora da academia. Nossa conversa abordou principalmente o seu blog. Boa leitura!
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Quais as questões relevantes nos dias atuais ao teu ver?
Paulo Falcão- Esta é uma pergunta muito aberta, mas vou tentar responder resumidamente. Poderia discorrer sobre o progressivo emburrecimento de debate público em qualquer tema, de sistema econômico às preferências musicais, mas vou centralizar em algo que retomo constantemente no blog e que, a meu ver, está na matriz desta questão: a falta de respeito ao sentido das palavras. Se desprezamos o sentido das palavras, se falseamos seu significado para que abrigue nossas teses, os conceitos se corrompem, o senso crítico se corrompe. Com isso a inteligência perde espaço para a esperteza, para o truque. Nada de bom pode derivar desta prática.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- O amigo de nosso GEACB Lúcio jr, pergunta sobre outra relevante questão: Paulo, embora seus questionamentos sejam de bom nível, você prossegue citando Olavo de Carvalho, uma figura que defende que existe doutrinação ideológica na escola. Esse é um ponto sensível para nós professores. Explique sua posição.
Paulo Falcão- Em mais de uma ocasião já disse que a mensagem é sempre mais importante que o mensageiro. Se um texto é elegante, no sentido em que a palavra é utilizada na filosofia, se tem coerência e respeita as palavras e os fatos, não vejo problema nenhum em citá-lo, seja de quem for. Em meu blog cito um enunciado dele que considero perfeito, no artigo TEORIA DAS GAVETAS. Até hoje não encontrei quem o contestasse com propriedade. Por outro lado, nunca cito ou citei as bobagens que ele diz.
Sobre a doutrinação nas escolas, ela é um fato e um boato ao mesmo tempo.
É um fato na medida em que diversos livros distribuídos pelo MEC são abertamente panfletários e revelam uma visão pobre e doutrinária dos assuntos. Uma rápida pesquisa no Google encontrará alguns exemplos.
É também um boato porque a grande maioria dos professores é tão fraca que não consegue transformar o que vai nestes livros em práticas na sala de aula.
Resta também a questão das preferências pessoais dos professores que possuem informação/formação sobre ideologias. É inegável que a maioria dos professores têm uma visão de esquerda, com críticas duras ao capitalismo e defesa de modelos socialistas. Foi assim quando eu era aluno e foi assim com meus três filhos, sobrinhos e conhecidos. Aliás, observo que boa parte das consultas ao blog Questões Relevantes vêm do Google através de palavras-chave “de esquerda” claramente ligadas a trabalhos escolares. Nestes casos o blog funciona como um contraponto à visão média dos professores.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Conte-nos sobre a origem de seu blog, o caracterize, e revele: seus objetivos vêm sendo atingidos?
Paulo Falcão- Meu blog nasceu de uma discussão familiar em que percebi claramente o prejuízo que a deturpação de certos conceitos pode trazer. Decidi dedicar algum tempo a discutir os assuntos mais comumente manipulados e distorcidos de maneira a desmistificá-los e ao mesmo tempo criar uma memória temática gratuita e acessível a qualquer um que navegue na internet. Pela qualidade dos debates que podem ser observados na área de comentários dos artigos posso dizer que o objetivo está sendo atingido e até mesmo superado. O número de acessos diários também tem sido uma grata surpresa. Raramente tenho menos que 95 a 100 leitores por dia. O máximo foram 2500 acessos em um dia, mas este foi um resultado fora da curva. Hoje, 26 de março de 2016 às 16:23 estou com 1176 leitores para 1320 artigos lidos.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Quais os limites e as críticas que podem ser feitas ao chamado liberalismo econômico e as democracias liberais?
Paulo Falcão- Esta é uma questão curiosa. Temos que lembrar que a principal crítica a ambos foi feita por Marx. Na época, apesar de ser possível apontar erros em alguns conceitos do nobre pensador, fazia todo sentido. Aquele objeto de análise tinha muitos e visíveis problemas. Como escrevi em um artigo, “Nos termos em que o estado liberal funcionava na época, eu também seria “de esquerda”, também defenderia que “tudo precisa mudar”. Mas é justamente este o ponto: o capitalismo e o estado liberal mudaram, e muito. Neste período, assistimos o que Schumpeter chamou de a “destruição criadora” do capitalismo reciclando suas bases e incorporando demandas sociais as mais diversas. O capitalismo e o estado liberal que temos hoje são semelhantes em essência (preservam a liberdade individual de empreender e a propriedade privada dos meios de produção) e absolutamente diferentes na regulação das condições de trabalho, direitos trabalhistas, acesso a serviços básicos como saúde e educação etc.”
Hoje, os números são claros para quem os olhar com isenção. As democracias liberais são responsáveis pela maior elevação da qualidade de vida das populações na história da humanidade, inclusive as que estão na base da pirâmide social. Dados como elevação da expectativa de vida, renda média, acesso à saúde e educaçãodemonstram claramente este fato. Lembre-se também que um modelo frequentemente reivindicado pela esquerda, as social-democracias nórdicas, bem como as do Canadá, Austrália e Nova Zelândia, são democracias liberais que praticam o liberalismo econômico.
Há, evidentemente, muito a ser melhorado ainda, mas a beleza da coisa é que as ferramentas necessárias para realizar melhorias estão no DNA do sistema. A cada conquista seguirão novas demandas, infinitamente. As necessidades evoluem e o sistema idem.
Não se conhece nenhum outro sistema político-econômico que tenha tal grau de eficiência.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- O que fazer para não ser sectário? Observas sectarismo nas direitas? Exemplifique?
Paulo Falcão- O primeiro passo, o passo fundamental para não ser sectário é ouvir/ler o outro. Prestar atenção no que está sendo dito. Não rechaçar nada a priori. Sem isso, o sectarismo já venceu. De certa maneira retomamos aqui o que respondi sobre ter citado Olavo de Carvalho: é importante O QUÊ está sendo dito, não QUEM está dizendo.
Sendo assim, é lógico que observo sectarismo, tanto à direita quanto à esquerda. O número de pessoas que não ouve, não lê, não entende e mesmo assim se arvora o direito de fazer críticas é, infelizmente, imenso.
Os melhores exemplos estão nos grupos de debate do Facebook. É raro encontrar quem leia o que comenta e mais raro ainda quem consegue formular uma crítica estruturada. A grande maioria é baseada em preconceitos e adjetivos.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Estamos em um bom momento quanto a formadores de opinião na mídia brasileira? Quais os seus destaques?
Paulo Falcão- Esta é uma pergunta difícil e poderia argumentar defendendo tanto o SIM como o NÃO. Vou escolher o mais difícil que é defender o SIM.
No campo da esquerda há o Blog da Boitempo, a Revista Forum (já foi melhor), a Piauí e o blog Lavra Palavra com pluralidade de vozes e boa fundamentação de seus pontos de vista.
Entre os grandes veículos, a estratégia é abrigar opiniões divergentes e até conflitantes, fornecendo múltiplos olhares sobre os assuntos mais sensíveis. É algo louvável em um momento de crise causada pela fuga de leitores para os meios digitais e a consequente queda de faturamento.
Meu destaque, em termos de qualidade, é o Programa Painel da Globonews com o William Waack. Os temas variam, mas o nível do debate é sempre muito bom.
O formato do Jornal da Cultura com seus dois convidados antagônicos também é interessante, embora muito inferior ao Painel.
No colunismo, tenho gostado dos artigos do Fernando Gabeira e Demétrio Magnoli. O Reinaldo Azevedo, embora ultimamente tenha adotado um tom mais de fofoca e gracejos que me incomoda, é ótimo quando se trata de analisar projetos de lei e legislação. Ninguém faz isso melhor do que ele.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Quais entre os teus artigos de seu blog consideras mais meritório?
Paulo Falcão- É difícil fazer este tipo de escolha. Prefiro dizer os que todos os meses mantém um bom nível de acessos. São eles, pela ordem quantitativa:
TEORIA DAS GAVETAS
A MERITOCRACIA E SEU OPOSTO
LIBERDADE, DEMOCRACIA E MARXISMO: ESTRANHO FETICHE.
“DEMOCRACIA SOCIALISTA” É O SACI PERERÊ DA CIÊNCIA POLÍTICA
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Quem é Paulo Falcão?
Paulo Falcão- Sou um livre pensador que prefere debater com antagonistas. Isto é o mais importante. Mas sou também alguém que já plantou cana, colheu amendoim, ajudou a manejar gado, plantou perobas, estudou em boas escolas, jogou vôlei, joga tênis, deu aulas particulares, entrou no ramo de marketing e publicidade comoestagiário e se tornou diretor de planejamento e criação, atuou para empresas nacionais e multinacionais e em quase 30 anos como patrão enfrentou uma única ação trabalhista (e ganhou a causa). Hoje, concilio a atividade de marketing com a de gestor de uma rede de Supermercados em Gurupi, TO.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual a sua análise desta frase de Silvio Romero "[...] e este é, aos meus olhos, o mais completo documento de nossa pobreza intelectual; sempre temos necessidade de pedir um guia aos povos ilustrados." ?
Paulo Falcão- De certa maneira, a frase acima, isolada, pode ser lida como um endosso ao que já disse nesta entrevista: a mensagem é mais relevante que o mensageiro. O valor de um texto está em sua coerência interna, não em seu autor. Assim, é importante estudar, conhecer os clássicos, mas há que se dar valor à produção intelectual contemporânea e fazemos isto avaliando sua lógica construtiva, suas conclusões. Mas a frase, quando colocada em seu contexto original, vai além e clama pela produção intelectual brasileira feita com os olhos em nossa realidade, em nossos problemas, algo que afirma ser inexistente.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Nós do GEACB agradecemos suas participações nos debates, bem como colaborações no nosso blog. Finalize com uma crítica ao trabalho do grupo de estudos e recado aos leitores desta entrevista.
Paulo Falcão- Penso que há um simbolismo evidente nesta entrevista, que é acolher “a voz do inimigo”, algo de grande importância nestes tempos de intransigências ridículas. Considero o trabalho de vocês necessário e, em boa medida, realizadores do que cobrava Sílvio Romero. Além disso, tenho o prazer de encontrar aqui debates às vezes duros, mas sempre interessantes.
Rafael da Silva Freitas: Nasceu no dia 29 de dezembro de 1982 em Santa Maria, RS. Historiador. Membro Permanente e fundador do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata. Produtor e radialista do programa "História em Pauta" na web rádio La Integracion. Colunista no Jornal de Viamão.
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