Escritor e historiador Everton Santos entrevista o secretário político do PCB Alvorada/RS, Rafael Melo. Tema: os comunistas e a conjuntura política atual:
Postado originalmente na linha de tempo no facebook do perguntador, introduzido da seguinte forma: “Amigos, segue abaixo uma entrevista que fiz com Rafael Melo. Foram questionamentos sobre a política atual. Já adianto que o conteúdo está um pouco extenso devido a complexidade dos temas. Vale a pena conferir!”
Rafael Melo. Crédito da fotografia: Bernardo Denker Krummer
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Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual a posição do comunismo (nos tempos atuais) em relação às outras correntes e ideologias políticas, levando em consideração a pluralidade necessária para a caracterização de um regime democrático e um histórico de algumas experiências totalitárias negativas?
Nós comunistas não somos avessos ao debate, pelo contrário. O que temos é posição política em vários assuntos, fruto de debates coletivos e construções históricas. Somos taxativamente militantes por um mundo de outro tipo, que elimine a exploração humana e todas as formas de opressão, nem todos dividem esses mesmos anseios. Costumo dizer que ninguém é obrigado a concordar comigo, de mesma forma que não sou obrigado a concordar com ninguém, nem mesmo com as “modas” teóricas que aparecem. Dentro do Partido Comunista temos o que há de mais democrático na experiência dos partidos políticos, o centralismo democrático. O exercício de esgotamento do debate interno, a não existência de “manda-chuvas” e a posição política coletiva, como experiência prática, me faz apostar que os comunistas estão entre os que estão mais dispostos à democracia e a experiência política prova isso. O militante comunista nunca é representante de si mesmo ou de suas ideias. Sua atuação é resultado de um processo político coletivo, do Partido Comunista (aqui diferente do que se entende por partido na perspectiva política liberal, que resume partidos a um conjunto de pessoas com interesses afins).
Na hora “H” são os comunistas que se levantam em defesa do pouco de democracia que temos, foi assim ao longo da história do Brasil. Muito comunista perdeu sua vida na história do mundo, para defender um mínimo de liberdade que temos hoje.
Agora, nesse ponto, é preciso fazer alguma ressalva sobre o que é democracia. Vejo muitas pessoas, inclusive de esquerda, defenderem uma democracia liberal, pautada em individualidades e possibilidade de concorrência. É um erro pra mim, confundir democracia com possibilidade de votar em políticos, que nada representam a população em um jogo de cartas marcadas que se estrutura para atender aos interesses dos mais ricos. Basta olhar o perfil dos políticos no mundo, não representam pluralidade de gênero, idades, ideias, cor, e por ai vai.
Para nós comunistas, democracia está relacionada não somente com o indivíduo (o que EU quero), mas com o coletivo (bem comum). É a defesa da coletividade em detrimento à individualidade. Muitos dos que conclamam democracia, não são capazes de pingar uma só gota de suor pela luta dos que mais sofrem no mundo. De que adianta falar em democracia, defender “instituições democráticas” se milhares de pessoas morrem de fome todos os dias? Para os comunistas, democracia é algo mais profundo que uma experiência de concorrência individual.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- A China, a segunda maior potência econômica do mundo, utiliza-se de diversos artifícios do jogo do capital. Seus produtos competem com os americanos e de outras potencias. A China é comunista ainda? Por quê?
Acredito que o tema da experiência chinesa exija uma conversa especifica e longa. Mas a China não é nunca foi comunista. De forma que acho complexo enquadrar o processo chinês como Capitalismo de Estado, é mais complexo que isso. A China é uma economia de mercado, dirigida por um partido comunista. Cresceu a ponto de ser a segunda e provavelmente será a primeira economia do mundo. Ao mesmo tempo, o crescimento econômico vem acompanhado de desenvolvimento social, aumento de direitos trabalhistas, e equidade social. China é hoje o país que mais investe em tecnologia visando o meio ambiente. O país está na contramão do mundo, desenvolvendo sua economia e aumentando direitos sociais. Ao mesmo tempo, não conseguiu por ora abolir a acumulação de Capital.
Para compreender o processo chinês, sugiro o canal que recebe o nome do camarada Jones Manoel, militante do PCB, que tem feito um excelente trabalho no YouTube. Há vários vídeos lá sobre o tema.
Vídeo de Jones Manoel sobre a China
Vídeo polemizando com Jones Manoel, acerca da China
Além disso, há bons textos no site do PCB. É o site partidário com maior número de análises internacionais no brasil. https://pcb.org.br/
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Quais as 5 experiências socialistas como política de governos, que foram positivas que valem a pena serem citadas aqui?
Mais que 5, eu cito praticamente todas. Na verdade todas as experiências revolucionárias, mesmo as burguesas, têm algo para nos ensinar. Há várias experiências políticas interessantes, que vão da socialdemocracia ao socialismo. Acredito que cada uma tem algo de positivo, ao mesmo tempo em que carrega erros que podemos analisar. As revoluções, inclusive as socialistas, são processos históricos complexos e dialéticos.
Não podemos, no entanto, cair em fetichismos mecanicistas e achar que poderemos aplicar uma revolução bolchevique ou uma revolução cubana no Brasil. Cada revolução tem suas características materiais e históricas e cabe aos comunistas o trabalho de compreender elementos políticos do Brasil que darão rumo à revolução por aqui. Nosso trabalho é para construir a Revolução Socialista Brasileira, compreendemos que estamos em determinado momento histórico, com questões materiais específicas.
Ao centro, líder da Revolução Cubana, Fidel Castro
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Sobre as experienciais socialistas no mundo, não é preciso muito trabalho para encontrar seus efeitos positivos nos próprios países e na sociabilidade do mundo como um todo. Falando das duas que citei, a URSS foi exemplo em vários aspetos de avanços sociais, a citar a vanguarda no direito das mulheres, a universalização da saúde e educação e as inúmeras contribuições para a ciência. Cuba é ainda hoje, um dos países com melhores indicadores socioeconômicos do mundo, mesmo com uma economia completamente frágil. Costumo dizer que uma das maiores contribuições da experiência cubana é o planejamento. Nenhum país faz tanto com tão pouco.
Também aqui, é preciso separar o joio do trigo. É extremamente importante analisar criticamente as experiências socialistas em seus erros e acertos, sem cair nas armadilhas do anti-comunismo. As experiências socialistas sempre foram atacadas com as mais diversas armas, econômicas e culturais. Outro dia, discutia com um rapaz que me chamava de assassino, por eu ser comunista. Me falou que morreram mais de 500 bilhões de pessoas só na era Stalin. Pedi que me indicasse a fonte, pois a informação era muito frágil, uma vez que a era Stálin, apesar dos desafios, apresentou crescimento populacional. Além disso, 500 bi é estratosfericamente maior que a população soviética da época. Ele me disse que a referência é um livro chamado “Livro negro do comunismo”. Para quem tem um mínimo de capacidade investigativa, sabe que ao ler esse livro é possível ver que as fontes históricas primárias são fortemente contestáveis e duvidosas. E esse é apenas mais um exemplo de debate anti-comunista atual. Ele se espalhou como fogo no palheiro, em mentes despreparadas, que acham que falar qualquer coisa é sinal de inteligência e liberdade intelectual. São na verdade, correias de transmissão dos mais ricos, que fazem de tudo para evitar que a roda do jogo vire. A alienação é a algema mais forte do Capitalismo.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- É possível o fim da polarização política atual, pra patamares mais civilizados, digamos assim? Como?
Sinceramente, acho que não. Gostaria de ter uma reposta mais otimista, mas tenho de ser honesto quando faço política. Não está em mim defender enganações para acalentar esperanças, como muitos liberais de esquerda fazem.
Acho muito difícil acabar com a polarização, ou diminuir ela no capitalismo, pois isso presumiria esconder ou “acalmar” as próprias contradições do Capitalismo. As disputas políticas em si não são, ao meu ver, o maior problema. Maior problema são as falsas polarizações, como a que ocorre entre Bolsonaristas e Petistas (esquerdistas, comunistas, socialistas, ou qualquer pessoa que possua pensamento minimamente crítico), que colocam trabalhadores contra trabalhadores enquanto a exploração capitalista segue de vento em popa. Isso esconde as verdadeiras disputas de classe. É preciso que trabalhemos para libertar os trabalhadores que ainda defendem seus exploradores, para que lutemos de fato pelos nossos interesses, os interesses da classe trabalhadora. Essa polarização é concreta e material. É a realidade da sociedade. Em vez de perder tempo com “Eu Avisei” – como se o processo político se resumisse em apertar botões coretos nas urnas - precisamos gastar nossas energias na disputa real da política.
Mesmo as “democracias mais maduras”, assentadas em economias solidificadas por anos de exploração econômica, volta e meia, fervem e os movimentos de massas tomam as ruas. É cíclico, e faz parte da incapacidade que o capitalismo tem de responder concretamente a vários dos problemas sociais. Há quem prefira esse sistema com suas contradições. Eu não prefiro não evitar esforços para construir outro modo de vida.
Acho que uma democracia real, com uma organização política que trabalhe de fato pelo bem coletivo, só será possível em uma sociedade de outro tipo: o socialismo que lutamos para construir.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual a pauta política mais importante atualmente e por quê?
Acho que é uma pauta complexa cheia de itens. Há questões imediatas que vão desde o acirramento das políticas austeras e dos modos de exploração modo trabalho (como as reformas trabalhista e da previdência), passando pelo avanço do conservadorismo e a reboque dele, das opressões (racismo, machismo, homofobia e outras fobias de todo o tipo, etc...), até uma certa “liberdade” que grupos fascistas e neofacistas vêm experimentando nos tempos atuais. Essas questões fazem parte de uma grande pauta social que está no contexto político do mundo e são típicas dos fracassos do capitalismo e suas crises. Todas elas fazem parte de uma luta constante e necessária, pelo campo do debate e da disputa ideológica e pelo enfrentamento também.
Mas a luta precisa de mediações e estratégia. Todas as lutas são legítimas, mas não podemos viras as costas para como vive e se sociabiliza a classe trabalhadora. Se fosse apostar em prioridades, retomaria ao que Lênin já escreveu em tempos parecidos: apostar nas pautas econômicas. Tenho dito, o moralismo não enche barriga e as condições de vida irão piorar a galope, caso o governo não mude sua rota. Por isso é preciso agir com energia. Ao passo que um verdadeiro projeto de emancipação da classe, não pinça lutas específicas, mas compreende-as na totalidade da sociedade. Por isso apostar no debate das condições reais de vida das pessoas, me parece a melhor alternativa de aproximação para um debate político.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Levando em conta a diversidade cultural no Brasil e um evidente aumento do poder político das igrejas, Qual é a postura do PCB em relação a religiosidade na política? É possível uma conciliação dos valores Marxistas com as comunidades cristãs?
Não só possível, como é necessário.Há uma falsa análise de que os marxistas não gostam de religião. Muito disso está relacionado a uma leitura equivocada de Marx, quando ele escreveu “Die Religion ... Sie ist das Opium des Volkes", traduzido por aqui como “a religião é o ópio do povo”. É uma leitura equivocada, pois pinçou essa frase de um contexto maior, onde Marx falava das formas de alienação do proletariado alemão, utilizando a religião como instrumento disso. A análise de Marx tanto estava certa, que hoje a dominação religiosa é um dos mais potentes instrumentos políticos do Brasil. Evidentemente que o postulado marxista, versa sobre a filosofia da materialidade. Ou seja, é contra explicações imateriais, ou “mágicas” dos fenômenos sociais e naturais.
Qualquer pessoa que luta pela humanidade deve lutar ao lado dos comunistas. É digamos, a luta essencialmente humana. Lênin dizia que o partido comunista não é um partido exclusivo para ateus, mas que faz política na perspectiva do ateísmo. Na prática, quer dizer que a luta dos comunistas vai se orientar pela realidade concreta, evitando análises políticas baseadas em concepções religiosas, como a ideia de que quem é pobre o é, pois, está sofrendo um castigo divino. As concepções religiosas são individuais e devem ser respeitas, mas não usadas como forma de sociabilidade.
Eu mesmo, não sou ateu. Sou praticante de religião tradicional yorubá e sou comunista atuante. É um exercício pessoal separar minhas concepções religiosas, que escolhi para mim, da atuação política. Isso no entanto, nunca atrapalhou minha militância.
Aqui é importante destacar que é do PCB a autoria da proposta constitucional, do trecho que versa sobre a liberdade religiosa no Brasil. Somos a favor da liberdade religiosa e contra as formas de dominação religiosa, principalmente aquelas que se mascaram de questão religiosa, para atuar em prol da dominação econômica.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual foi o motivo da ascensão da extrema direita no Brasil, e quais alternativas para a retomada de relações políticas por parte dos que agora estão sendo amplamente excluídos e estigmatizados?
Acho que são muito motivos. É uma análise complexa que ainda estamos fazendo, mas tem algumas coisas que dá para pôr na mesa. Primeiro é aceitar que Bolsonaro e sua turma souberam jogar o jogo. Acertaram na linguagem, nas pautas populares e nos anseios do povo. Minha avaliação é que a burguesia não apostava em Bolsonaro, mas teve que engolir ele. O resultado é esse governo atrapalhado e cheio de lambanças. Bolsonaro chegou ao poder com os votos dos trabalhadores, que preferiram assinar um cheque em branco (que era o programa eleitoral de Bolsonaro), que manter a esquerda no poder, aí entra nossa autocrítica. O segundo ponto, é compreender os limites do projeto democrático popular e da democracia de coalização. Lula trouxe grandes avanços ao país, mas errou ao achar que podia domesticar a burguesia. A burguesia não se domestica, ela sempre quer mais, senão a roda do capitalismo não anda. Dilma intensificou as políticas austeras, com ajustes fiscais e cada vez mais espaço para o que há de pior na política brasileira. Os problemas do governo Dilma, em sua maioria, são problemas do capitalismo, que foram usados como problemas do PT e por consequência de toda a esquerda. Acabou que a burguesia entendeu antes de nós que a conciliação não dava mais e descartou a esquerda, com um golpe parlamentar e jurídico.
Esse é um dos problemas de “acalmar” as contradições, elas nos traem. Por isso a decisão do PCB de sair do governo, antes do fim do primeiro ano de mandato go governo Lula foi acertada. Um governo que nasceu nas pautas sociais foi pendendo aos poucos para o mercado. Não concordo muito com a ideia de que “as elites não aceitaram a democracia”. Acho essa uma análise limitada que pode nos levar ao erro político. As elites econômicas querem ganhar dinheiro, e um capitalismo em crise, precisa aumentar sua máquina de fazer dinheiro.
Outro ponto extremamente importante está na atuação da esquerda como um todo. A grande parte do campo foi deixando pautas classistas de lado, deixando um liberalismo penetrar em todas as esquerdas. Embora pra mim a luta nunca mudou, é visível o fracasso a esquerda na luta de classes recente. Perdemos quase todos nossos militantes de base e criamos uma horda de burocratas que só sabem fazer políticas com cargos e governos, uma atuação adestrada à democracia burguesa. Os grandes partidos de esquerda viraram máquinas de fazer voto e nulidades políticas, que dependem de alguns bons quadros para sobreviver. A pseudointelectualidade liberal da esquerda, abandonou a teoria revolucionária e se encurralou em lutas que cada vez menos faziam sentido para os trabalhadores. Criamos sindicalistas preguiçosos e autoritários, líderes estudantis dependentes de verbas de governo, uma classe acomodada aos pequenos ganhos pessoais. Ao mesmo tempo em que a vida ficou mais “fácil” pra todo mundo, ao deixar o combate do capitalismo de lado, fomo engolido por ele.
A prioridade é retomar o projeto classista como o grande projeto da esquerda brasileira. Muitos falam “é preciso retomar às bases” o que confesso me assusta um pouco. Onde essa gente estava esse tempo todo? O fato é que precisamos tomar o trabalho político com seriedade, tendo a classe trabalhadora com prioridade. Vejo poucos movimentos críticos na esquerda em geral. Querem repetir processos que já se esgotaram. Muitos não conseguem abrir mão do carguismo da pequena-política. Enquanto as máquinas eleitorais se voltarem para eleger pessoas, antes de qualquer projeto político, seguiremos sendo pisoteados. Esse é o campo da direita, se repetirmos iremos perder sempre.
Pra mim é preciso ouvir a classe: radicalizar nossa pauta, fortalecer o trabalho de base, dar voz aos trabalhadores. Pra mim é assim que se cria unidade, não dividindo cargos em governos, resultando em saladas mistas que não passam de boa intenção inocente.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Por que você escolheu a luta política como prática de vida, se já tem emprego estável e família constituída?
Decidi me organizar politicamente por sofrer na pele as consequências do capitalismo. Quando fui tentar comprar uma casa, vi que a vida era muito mais que nossos sonhos juvenis. As contradições do início de vida adulta foram o estopim para que eu decidisse dedicar minha vida para construir um mundo novo. Não é uma decisão fácil. Já custou muito para mim e para minha família. Até com ameaças de morte aprendi a lidar.
Mas há os que deixam a história passar. Eu decidi viver a história.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- A cidade de Alvorada é uma das mais violentas do país, quais seriam as proposta do PCB para de alguma forma responder a esse problema que faz tantas pessoas sofrerem na nossa querida cidade?
Primeiro é esquecer as saídas mágicas. A Política de Segurança brasileira é ineficaz. Os dados mostram isso. As polícias não dão conta de nossa segurança e por mais boa vontade que se tente ter com a Brigada Militar, isso é um fato. Qualquer partido que disser que vai sozinho resolver problemas de segurança em nível municipal está mentindo descaradamente.
Acreditamos que o poder municipal tem que fazer aquilo que há tempos não faz. A violência cresce onde não há perspectiva de vida. Onde não existem políticas sociais. Em Alvorada, se acostumou que a prefeitura faça o mínimo e olhe lá. Se não existir perspectiva, não há nenhuma “inteligência policial” que resolva o problema. Claro que atuações pensando a questão imediata podem ajudar, mas não fazem milagre. Enquanto a polícia ficar fazendo barreira de proteção em frente de porta de banco, milagre nenhum vai acontecer. Enquanto a brigada seguir sendo utilizada como instrumento político, para barrar as lutas populares e manter a ordem (ordem do capitalismo), falar em combater o crime beira ao moralismo barato.
Nossa proposta é a atuação concreta. Atuando na construção de bibliotecas populares e na educação popular, vi que a construção de perspectivas de vida, estudo e trabalho, ainda são as armas mais potentes. Quem acha que a intensificação da violência policial resolve alguma coisa, só quer se enganar. A experiência do Exército nas favelas do Rio, comprova isso.
O PCB tem um programa amplo para Alvorada baseado na Radicalização da Democracia e no Poder Popular. Sugiro a leitura do texto “Esboço de propostas do PCB para um governo municipal em Alvorada”, que é um texto introdutório para as eleições do próximo ano. Acreditamos que problemas como os da segurança, serão resolvidos quando nos esforçarmos para construir uma cidade de outro tipo. Acreditamos na inversão do poder, no poder nas mãos dos trabalhadores. Somos contrários a política de gabinete e das ações verticais. O debate da cidade é um debate público.
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- O desemprego assola o Brasil, e o debate constante sobre economia trás inúmeras estratégias para gerar investimentos e o aquecimento dessa economia, algumas delas desgastam as relações de trabalho através da desvalorização do empregado, vimos a pouco a reforma trabalhista que acabou com a validade da CLT praticamente. Como gerar mais empregos e elevar a qualidade de vida das pessoas ao mesmo tempo? Isso é possível?
Não só é possível como é o caminho. Todas as grandes economias em alguma medida têm de apostar no desenvolvimento social. As que não fizeram caíram nos seus ciclos de crises, pois o capitalismo é dependente da exploração do trabalho e da venda de produtos, em alguma medida.
A questão é que os limites do capitalismo estão cada vez mais restritos. O capitalismo produtivista está ficando no passado, deixando cada vez mais espaço para o capitalismo rentista. Do capital portador de juros, sem trabalho. Dinheiro que gera dinheiro e não produz nada. A bolha do capitalismo está cada vez mais perto de estourar de novo e de novo e de novo... Seria necessária uma nova ordem econômica.
Mas a médio prazo a saída intermediária seria inverter o que Bolsonaro e Guedes estão fazendo. A política do governo pauta a abertura dos mercados ao capital estadunidense, deixando a mingua o empresariado nacional. Seria nesse caso necessário uma política de desenvolvimento industrial-nacional, uma boa reforma bancária, investimento público em desenvolvimento, além de atuar na reversão do sistema de dívida pública, que é o maior ralo de recursos do mundo. Tudo isso tem uma série de limites e esbarraria em pressão internacional dos países que dominam a economia e não querem deixar de explorar o Brasil.
Certamente o Brasil seria alvo de ataques econômicos. Mas apesar disso, me parece uma política muito mais frutífera, que o neocolonialismo de Guedes. Ficar agradando Trump, não tem trazido resultados positivos.
Paulo Guedes e “Seu Jair” Bolsonaro |
Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual é o papel do comunismo atualmente na política nacional, levando em conta a gravidade da ascensão do fascismo? Há diálogo com os diversos setores? É possível uma união das esquerdas, e até mesmo algum tipo de alinhamento com sociais democratas e liberais, em uma grande coalizão estratégica?
O PCB tem se colocado firmemente na luta na luta contra o fascismo. Obviamente que a luta contra o fascismo não passa só pelo PCB, mas nós estamos abertos para construção conjunta. Só em Alvorada, são mais 50 horas semanais dedicadas ao trabalho de base. Recentemente lançamos uma campanha sobre o governo Bolsonaro, queremos começar com o básico, dialogando com as pessoas.
Acho que as alianças estratégicas são importantes e podem ser trabalhadas, só não podemos cair na ilusão de que são o suficiente para derrotar o fascismo. A pauta conservadora está no seio na classe trabalhadora, sem trabalho popular vamos remar sem sucesso.
Temos conversado com os partidos da esquerda, mas afirmo que não é uma tarefa fácil. O gerencialismo burguês tomou a esquerda de tal forma, que por vezes parece que estamos em campos opostos. Nunca fizemos tantos esforços para unificar a esquerda, estamos dispostos a fazer o máximo que for possível, mas o desafio é grande. Mais difícil que parece. Para quem olha de fora, digamos assim, não ficam claras as incongruências que tomaram a política partidária nos dias de hoje. Nós não conseguimos é fechar os olhos para elas. Mas repito, o PCB quer um debate de unificação pela luta classista, mas nem todos estão dispostos a fazer. Se não aprofundarmos nosso debate, seremos derrotados novamente.
Sobre os liberais, acho mais difícil. Os liberais brasileiros estão tomados pela pequena política. Acho que eles vão demorar para lutar contra o governo ainda, mesmo porque estão ganhando o seu quinhão do governo. O partido NOVO por exemplo, é o mais fiel ao Bolsonaro, depois do PSL. Acho mais provável que os liberais atuem como parasitas. Vão fazer o que fizeram com os governos petistas, vão sugar até o fim, depois vão sair como se nada tivesse acontecido e como se fossem oposição. Essa tem sido a prática dos liberais brasileiros.
O Partido Novo está alinhado com o governo Bolsonaro em diversas questões, a exemplo da desigualdade de salários para homens e mulheres
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Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata- Qual é a importância da cultura e políticas que lhe sejam destinadas?
Sou suspeito em falar, pois trabalho diretamente no campo da cultura popular. Mas acredito que a cultura, entendida de forma ampla, é um dos principais pilares de libertação dos trabalhadores. Mas ela não pode ser entendida como instância de luta, fora da totalidade da sociedade capitalista. O passado recente é nosso professor: os governos do PT foram os que mais investiram em cultura (bem ou mal), e isso não foi o suficiente para vivenciarmos uma onda de culto à ignorância. Os sistemas de dominação humana são tão poderosos que iniciativas esparsas de fomento a cultura, não são o suficiente. São sim um excelente começo. Para que os trabalhadores participem da política, por exemplo, é preciso que tenham minimamente uma cultura de leitura, estudo. Que ao menos tenham a capacidade de escolher o que vão consumir no campo da cultura. Por isso, investimos fortemente na construção de espaços de cultura popular nos bairros de Alvorada.
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