Vamos chegando ao fim da jornada pelas terras de Pindorama, o Brasil brasileiro, não pelo esgotamento dos assuntos sobre este vasto e variado de aspectos Brasil antes de Cabral. Mas sim justamente o contrário, em função de que há muito a se falar ao mesmo tempo em que novos temas a ser tratados igualmente são necessários se retomar. Logo, após seis artigos seguidos tratando de um intenso e movimentado fragmento de nossa história do Brasil, a necessidade de novas temáticas abordando outras histórias além da de nosso país antes da colonização e, mesmo além de nosso Brasil.
Nisso, como terminar uma saga que ainda tem muito sobre o que se dizer? Tantas omissões e sensos comuns que fazem a dita pré-história brasileira ser vista como um tempo sem histórias a se interessar.
Podendo dizer, ainda, por exemplo, sobre os chamados geoglifos descobertos nos estados do Acre, Rondônia e Sul do Amazonas. A quem não saiba, o que é chamado de geoglifo se faz uma grande figura feita no chão (geralmente com mais de quatro metros de extensão), em morros ou regiões planas. Sua construção pode se dar pela disposição organizada de sedimentos (como pedras, cascalho ou terra), criando um desenho em relevo positivo (ou alto relevo), ou pela retirada de sedimentos superficiais de modo a expor uma rocha subjacente, criando um relevo negativo (que pode ser entendido também como um baixo relevo). Onde de qualquer modo, em ambos os casos a formação da imagem se dá pelo fato de que a região trabalhada se destacará do solo natural do local, formando o desenho.
Não tendo como esses grandes desenhos não atraírem a atenção de curiosos e estudiosos, tanto pela forma como foram feitos, como pelo porquê de o terem sido elaborados. E porquê isso? Simples, por causa de suas grandes dimensões que não permitem a sua visualização do solo. Levando à questão como desenhos, em alguns casos bem complexos (como, por exemplo, os deixados no deserto de Nazca no Peru) poderiam ter sido montados sem poderem observar ao andamento do seu traçado? Isso mesmo! Até hoje um mistério, apesar de algumas teorias sobre o assunto. Tanto a especulação fantástica de seres extraterrestres até a possibilidade mais realista de que tais populações tinham tecnologia para fabricar balões, inspirada no fato de que um vaso foi encontrado com o desenho de um balão. Ou o que se supõe que seja um balão.
Geoglifo encontrado no Peru
De qualquer modo, por ora, somente podendo se supor. Resta muito por se descobrir destes achados de conhecimento relativamente recente. Como é o caso destes geoglifos em território brasileiro, descobertos em 1977, durante uma varredura arqueológica na Amazônia Ocidental, por Ondemar Dias, Frankly Levy e Alceu Ranzi. Tendo desde então se descoberto em torno de 523 destes geoglifos. Contudo, tendo sido somente a partir dos anos 2000 que esses sítios tiveram projeção midiática passando a ser alvo de intervenções científicas sistemáticas. Quando a partir deste momento as pesquisas arqueológicas nessas áreas, revelaram informações importantes sobre o manejo da paisagem amazônica por grupos indígenas que habitaram a região entre, aproximadamente, 200 a.C – 1300 d.C., e sugerem um novo paradigma sobre o modelo de ocupação da Amazônia por densas sociedades pré-coloniais.
Tendo recentemente importantes pesquisas por Denise Schaan, da Universidade Federal do Pará (que faleceu em 2018) percebido grande diversidade de formas, além das circulares, tais como quadrados, octógonos, dentre outras formas. Possivelmente usadas para fins rituais, diante da ausência de habitações em seu perímetro. Podendo eles ter marcado festividades, cerimônias, rituais e até mesmo a confrontos. Nas escavações também já foram encontrados vestígios de cerâmicas, ferramentas e um tipo de solo fértil produzido por humanos. Assim como um doutor em arqueologia, Jonas Gregório de Souza, afirmou que as escavações eram compostas por valetas – vala para escoamento das águas – e também possuíam estruturas como paliçadas de madeira - conjunto de estacas de madeira fincadas verticalmente no terreno.
Geoglifo encontrado na Amazônia
Ou seja, algo que diverge da versão propagada de que a Amazônia era vista como um lugar inóspito. Portanto, sendo os geoglifos, hoje, outra evidência, assim como os sítios arqueológicos marajoaras e tapajônicos (ver Povos do Pindorama – partes 03 e 05), por exemplo, de que a vasta, quente, úmida e equatorial floresta amazônica não era um lugar inóspito para se abrigar uma grande população, organizada e hierarquizada que vivia aqui. De modo que quanto mais se aprofunda o conhecimento de nossa terra Brasil mais se surpreende em relação às ideias equivocadas de que aqui se fez somente um recorte do passado sem história.
Portanto, havendo muito mais a se falar, desta terra de Pindorama e assim o podendo ser falado futuramente novamente. Como, por exemplo, a cultura de Kuhikugu na região do Xingu. Curioso? Pois se sim, sendo somente um dentre outros assuntos sobre a Terra das Palmeiras de tanta diversidade que, ironicamente, se faz ignorada. Cabendo por ora a reflexão sobre com que olhos você poderá agora ver à chamada “pré-História” brasileira. Que de um tempo antes visto como estático pode se constatar bem como nada teve de uma trajetória sem importância, sem nada a ensinar.
Pois senão, num tempo em que a questão ecológica se faz crucial a própria sobrevivência humana, podemos ou não muito nos beneficiar ao descobrirmos cada vez como estes grandes contingentes viveram por séculos na região amazônica sem para isso precisar agredir ao meio ambiente? Pois senão num tempo em que a demanda por mais alimentos para um mundo em expansão (onde já somos 07 bilhões de habitantes), não pode uma grande tecnologia como, dentre outras, a “terra preta de índio” (ver Povos do Pindorama – parte 04) ser uma solução para se alimentar mais sem para isso ter de mais ainda se degradar o meio ambiente? Vendo à organização dos chamados sambaquis ou dos tesos marajoaras, ainda assim podemos continuar a alimentar mito de povos atrasados sem qualquer organização em nossa herança cultural?
E deste modo podemos indo com mais questões a nos mostrar o quanto temos a ganhar com o aprendizado sobre este vasto período, todavia, por ora não sendo preciso mais enfatizar ao que, por certo já se faz evidente sobre o quanto que a chamada “pré-história” brasileira tem muito mais a nos ensinar do que a mera curiosidade sobre ela. Então por que não se fazer justiça reconhecendo a toda esta história aqui contida como de fato um respeitável recorte da história? Para tanto tendo mais espaço nos livros escolares, deste modo não tendo seu estudo confinado num breve capitulo ou sobre “pré-história” na América ou meramente antecedendo à vinda dos europeus para cá. Indo além, mostrando outras perspectivas a transcenderem a tradicional história eurocêntrica. Ora, por que não?
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