ZUMBI DOS PALMARES: vendo mais ao homem e menos ao mito PARTE 01

 Zumbi foi um dos líderes do Quilombo dos Palmares e acabou sendo morto por bandeirantes portugueses em 20 de novembro de 1695.[1]

 

É fato que toda e qualquer data histórica como, por exemplo, o dia 20 de novembro tem uma forte, intensa, importante simbologia que inspira valores, evoca ideais e por isso referências como essa sempre merecem uma atenção ainda maior do que o mero celebrar. Precisando ver a elas um pouco mais a fundo. Afinal datas comemorativas tanto podem estimular grandes inspirações como igualmente podem meramente exaltar heróis e nada mais.

Isso mesmo, por mais que muitos podem se perguntar qual é a diferença. O que, assim, me leva a pretensão de afirmar que heróis são (sob o ponto de vista dos seus adoradores, é claro) os ídolos imaculados, perfeitos como os protagonistas das grandes epopeias. Por mais que, igualmente as pessoas não admitam isso. Não, mas podemos perceber isso quando então as pessoas que o adoram simplesmente o exaltam sem, comumente, sem querer realmente aprender algo com esta referência.

Tanto que quando se nota a adoração, também se percebe que seus adoradores se fecham às criticas sobre seu ídolo. Dizem que o apontar de possíveis falhas é caluniar, difamar seu herói, olham como uma heresia não concordar com a mesma visão que eles.

Ao passo que inspirações são exemplos que vemos em alguém, modelos em que podemos nos apoiar, sem que para isso precisemos se cegar aos seus defeitos ou simplesmente sua condição humana, imperfeita. Ou seja, tentar ver o indivíduo como um todo, reconhecendo seus valores, sem se cegar às suas falhas que possivelmente devem existir. Simples assim. Não que nós precisemos de uma busca por polêmicas e falhas em alguém para se acharmos críticos, conscientes. Não mesmo.

Pois o ponto em que quero chegar é que todos nós precisamos de referencias em que se apoiar, todos. Podendo ser elas pessoas do nosso cotidiano e também vultos de grande repercussão. Mas acima de tudo seres humanos, não seres tão acima de nós como costumam muitos a ver seu herói. E por isso digo que triste é a sina dos que precisam se apegar a heróis. Digo heróis e não inspirações. Por mais que também seja mais comum do que parece a dificuldade de achar a fronteira entre um e outro.

Mais um motivo porque muitos se recusam a admitir isso, até mesmo para si próprios, mas isso não muda o fato que seu objeto de admiração o leve a uma ardente adoração, o torne incapaz de ver as falhas deste a quem tem por modelo. E comece a querer crer que apenas os valores que ele trazia eram os mais certos, se fechando a outros pontos de vista. O que se reforça meu entender do herói ser uma idealização por seus seguidores.

Pois eu arrisco a pretensão de afirmar que o termo herói para mim é uma idealização que não aceita que se sequer se arranhe a imagem de seu símbolo adorado. Mesmo quando seus adoradores digam que não o adoram, mas defendem raivosamente a qualquer crítica sobre ele. E, após todo este tempo que estou falando sobre isso, por certo, vocês podem se perguntar: aonde quer chegar com isso? E assim eu vou dizer agora.

Para ajudar a entender melhor aos erros e acertos do passado, também se faz interessante analisarmos as motivações, inspirações e desdobramentos de eventos promovidos por qualquer personagem histórico. Buscarmos uma compreensão dos avanços, retrocessos e permanências que ele pode ter proporcionado.

Compararmos se suas visões de mundo quando então viveram (ou ainda vivem) se elas ainda se aplicam a nossa realidade como um todo ou parcialmente.

Mas isso exige se despir do medo, em não enxergar a um ídolo com todas as virtudes possíveis, pois para muitos fazer isso é o mesmo que não conseguir mais admirá-lo se o ver como algo mais parecido com os demais “mortais”. E claro que temos o inverso também, tão controverso quanto ao que acusam em seus opostos.

Ou seja, aqueles que só conseguem ver o pior de um personagem com base em apenas em seus defeitos, em nada reconhecendo aos seus méritos junto. Pois para estes só importa então destruir a um ídolo sem se importar com o que esteja junto. Ignorando aos benefícios que o simbolismo deste personagem pode inspirar em outros. Ou mesmo o fato de que igual o fanatismo na idolatria, a obsessão em destruir algo apenas por uma fixação igualmente é uma tolice.

Mas aqueles que o fazem acreditam estarem sendo mais sábias, serem mais inteligentes; como se ser crítico apenas pela crítica, ser um aficionado por polêmicas fosse um atestado de maior evolução intelectual. E parando para refletir sobre isso, é claro que tanto um extremo como outro não leva muito longe.

Por mais que seja muito, muito comum no revisionismo histórico atualmente, esse extremismo de alguns em se defender que do “pedestal” se passe para a lixeira da história ao menos dados personagens.O que, evidentemente, é só a outra face de uma mesma moeda que a dos que tão só sabem idolatrar. Pois não é difícil concluir que tanto os adoradores como os detratores assumem exatamente uma mesma idolatria em “santificar” ou “demonizar” um vulto histórico por uma mesma necessidade de afirmação dos seus valores ideológicos. Por um anseio de mostrar aos outros que tem mais razão, que está mais certo.

Por mais que quase sempre não consigam ver que querem apenas afirmar algo que querem ter como a sua única verdade. Como é o caso, dentre vários outros exemplos, justamente do líder negro conhecido como Zumbi dos Palmares. Pois é fato que seu nome comumente aparece entre esses dois extremos: adoração ou detratação, herói ou vilão. Invés de procurar se entender suas motivações, o ambiente que o forjou, etc.

E como isso seus defensores olham aos que o criticam como ao serviço do conservadorismo, dos valores elitistas. Ao passo que seus acusadores olham aos que o exaltam como militantes deslumbrados. Pesado? Infelizmente sim. E digo mais: não há razão para essas acusações de um lado sobre o outro. E por isso que quero começar aqui uma reflexão a ser proposta: debater um olhar diferente destes dois extremos, claramente, sem grandes pretensões, do homem Zumbi.

Claramente não ignorando como ele já foi amplamente estudado em trabalhos acadêmicos e por isso apenas oferecendo algo simples que aos que gostem da ideia nada impede que se aprofundem mais futuramente com pesquisas ainda mais profundas.

Então vamos tentar fazer justamente isso: aos poucos vir a entender a dados aspectos do homem imortalizado pela alcunha de Zumbi dos Palmares por detrás do mito que o recobre. Não para lhe julgar sob um ou outro ponto de vista, mas para que cada lado, admiradores e detratores, possa refletir um pouco mais sobre a opinião contrária da sua.

Onde alguns tendem a criar uma imagem mais próxima de um herói popular, símbolo da luta contra a opressão e escravidão. O que muitos a lerem podem afirmar que é sim isso mesmo. E essa afirmação neste artigo em questão não nos cabe questionar se certa ou errada. Até porque pessoas se ocupando ardentemente com essa polêmica mais que abundam.

Já outros o mostram como um líder aristocrático, elitista, como, aliás, em geral são os membros das monarquias em geral. O que muitos a lerem também podem afirmar que é sim isso mesmo. E do mesmo jeito digo que só espero ajudar num esforço para se escapar, nem que seja um pouco somente, desta dicotomia, onde ou ele é santificado ou demonizado e com isso pode se perder de conhecer uma história ainda mais rica como a que vamos tentar fazer mostrar. Que começa muito antes do próprio nascimento deste Zumbi e que continua após a sua morte.

Aspectos que começaremos a ver assim em uma pequena série, a se iniciar a partir de nossa próxima postagem, para assim oportunizar as pessoas que queiram, lentamente possam refletir sobre esta discussão. Começando é claro por um rico contexto que antecede ao nascimento de este líder guerreiro. Sendo, por ora, ainda interessante, lembrar que a imagem, para qualquer vulto histórico, seja de herói “sagrado”, seja de vilão da história nunca poderá ser uma questão de todo encerrada. Pois em toda a trama, quem é herói ou vilão, depende acima de tudo, dos olhos de quem o vê.

(continua....)

 

Sobre  o autor: 

LUIS MARCELO SANTOS: natural da cidade de Ponta Grossa (estado do Paraná) é professor de História da Rede Pública Estadual do estado do Paraná, Escritor e Historiador. Especialista em ensino de História e Geografia, especialista em ensino religioso e mestre em História formado pela UEPG, já publicou artigos para jornais como o Diário da Manhã e o Diário dos Campos (de Ponta Grossa) e Gazeta do Povo (de Curitiba), assim como a obra local (em parceria com Isolde Maria Waldmann) “A Saga do Veterano: um pouco dos 100 anos (1905-2005) em que o Clube Democrata marcou Ponta Grossa e os Campos Gerais”.


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