Entrevista Rafael Camargo

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Rafael da Silva Camargo, mais conhecido como Rafael Camargo , é Pós-Graduando em História e Cultura Indígena e Afro-brasileira na ULBRA.

Atualmente é diretor do  blog www.porquerafael.blogspot.com.br ,blog voltado a história e cultura do Município de Julio de Castilhos onde reside. Secretario da ONG Ativa-Ação, ONG voltada para ações educacionais e culturais diversas. 
(mais informações no final do texto)





1- Professor Rafael, diga-nos o que te motivou a estudar história, almejando uma profissão tão desvalorizada socialmente e pelos sucessivos governos?

A motivação para o estudo da história advém da necessidade de se compreender o mundo em que se vive, as mazelas e diferenças sociais nas quais nos encontramos.

 A valorização financeira ficou em segundo plano quando optei pelas ciências humanas, em um país como o nosso onde o profissional de educação é cada vez mais desvalorizado e em muitos momentos desmotivado a propor novas práticas pedagógicas, os governos optam por praticas pífias, que acabam por afastar o estudante da vida acadêmica docente.

2- Conte-nos sobre tua experiência em pesquisa e docência?

Tive uma experiência marcante na docência que foi participar da redação e da execução do ‘Projeto Platão’, projeto este dirigido a população de classe média baixa, neste projeto era ministrada aulas preparatórias de pré-vestibular a alunos considerados “carentes”. Em sala de aula procuro demonstrar aos alunos a importância do pensamento critico, além obviamente de compreender fatos históricos e suas implicações no cotidiano da população atual.

Na área de pesquisa meu trabalho é pautado na busca da compreensão do mundo em que vivemos para tal utilizando a relação entre a ação entre o homem e o reflexo delas na sociedade.

Tenho pesquisado sobre o período escravocrata no Brasil para que possa entender a grande desigualdade social existente nas mais diversas áreas do Brasil e em especial na região central do RS, pesquiso frequentemente também a história social da região com o intuito de entender as relações interpessoais, sociais e culturais desta localidade e por consequência do Rio Grande do Sul como um todo.

3- Fazes um interessante blog chamado 'Por quê Rafael", aonde abordas principalmente o município aonde resides! Como ele funciona? E quais são os fatos mais marcantes da história de Julio de Castilhos, no interior do Rio grande do Sul? 

O “Por quê Rafael?” surgiu inicialmente como ferramenta de publicação de pesquisas relacionadas a história local de Júlio de Castilhos, havia me desligado do Museu Vila Rica onde já desenvolvia um trabalho similar, divulgando pesquisas relacionadas não apenas a fatos históricos bem como peças pertencentes ao acervo daquela instituição. Com meu desligamento da instituição por vezes era abordado na rua pela comunidade em geral com perguntas do tipo, Porque Rafael isto, por que Rafael aquilo? Destes questionamentos advém o nome do Blog.

As pesquisas publicadas no blog são realizadas a partir de inquietudes acerca de personalidades e fatos ocorridos na sociedade local, algumas delas sugeridas por leitores e amigos.

Tenho tentando ampliar os horizontes desta mídia eletrônica mantendo a essência dos trabalhos lá publicados, desenvolver novos e paralelos trabalhos, como a PQR?TV, onde serão produzido vídeos não apenas relacionados a história local, terá também debates de diversos assuntos com a presença de outros historiadores e pensadores de diversas áreas do conhecimento, tudo isto com o intuito de transformar o blog em um local atrativo e enriquecedor ao ser utilizado como fonte de pesquisas.

Em Júlio de Castilhos ocorreu a chamada Convenção da Reserva de março de 1889, nesta convenção Júlio Prates de Castilhos foi elevado a condição de líder maior do Partido Republicano Rio-grandense, nesta cidade ficava uma das primeiras Reduções Jesuíticas do Estado, a Redução de Nossa Senhora da Natividade, o município é terra natal de políticos influentes no cenário nacional tais como: Júlio Prates de Castilhos, Alberto Pasqualini (nascido no então distrito de Ivora).
O município foi rota constante de tropeiros que cruzavam o Estado em direção ao Sudeste levando gado Gaúcho e trazendo daquela região produtos diversos.

4- Frase de Suchodolski em Tratado de Pedagogia: "A escola não deve cultivar o preconceito segundo o qual a melhor verificação dos chamados 'resultados' do ensino são os exames, mas sim levar o aluno até ao ponto em que sinta a necessidade de aprender cada vez mais". Consideras isso possível? Como fazê-lo?

Não é só possível como indispensável, a comunidade docente por vezes não se julga confortável em sair da “zona de conforto” em que se encontra, deixando de desenvolver novas práticas pedagógicas que façam com que o aluno sinta em prazer em aprender costumo dizer que:

"O professor que não aprende com seu aluno dificilmente o ensinará algo contundente, pois o aprendizado real consiste na dialética constante entre educando e educador."

"Não culpe uma criança por não ter prazer em aprender caso ela não tenha um professor que possua prazer em ensinar."

O que quero dizer com isto é que se faz necessário que ocorra sempre uma dialética entre professor e aluno na busca de uma educação plena e consistente.

5- Comentes sobre os autores que te sirvam de referencial teórico ou que apenas tenhas grande admiração? 

Existe uma gama imensa de autores que me servem de referencial teórico e de pensadores que nutro admiração uns renomados outros nobres desconhecidos.
Posso citar alguns para não me tornar muito extenso, inicialmente no que diz respeito à história da região em que vivo um dos autores que mais admiro é o pesquisador Firmino Costa, este pesquisador provavelmente seja a pessoa que mais se debruçou no estudo da história do município de Júlio de Castilhos e região, tendo escrito livros importantes para o estudo da história local, tais como “História de Júlio de Castilhos para crianças”, “Terra de Vila Rica, contribuição ao estudo da história do município de Júlio de Castilhos”, possui ele também vários artigos e uma coluna semanal no jornal local onde descreve como era a sociedade em diversas épocas.

Jacob Gorender, historiador marxista falecido em 2013, é outra influência direta em meu trabalho, Gorender traz paralelos entre o escravismo colonial e a politica republicana nacional dentre suas obras destacaria: “O Escravismo Colonial”, “Combate nas Trevas”, dentre outros livros e artigos.

Boris Fausto é outro historiador que admiro muito e seguidamente recorro a seus trabalhos, destacaria, dentre outros: ”Trabalho urbano e conflito social”,Getúlio Vargas: O poder e o sorriso”,História do Brasil”, “Fundação para o Desenvolvimento da Educação”

Trazendo para meu trabalho de pesquisa referente ao trabalho escravo e a população indígena citaria autores como: Prof. Sidney Chalhoub, Prof. Maria Angélica Zuban, Prof. Julio Quevedo, Mario Maestri, Prof. Giane Escobar, Abdias do Nascimento dentre outros.

Na área pedagógica não poderia deixar de citar Darcy Ribeiro, Paulo Freire ambos que dispensam comentários.

6- Um debate atual e necessário é sobre as diferentes teorias de história. Qual o teu posicionamento? Que linhas tu segues na pesquisa e na educação? 

Não é fácil analisar seu próprio trabalho e posicionar em uma escola historiográfica, é uma tarefa que deixo para outros pesquisadores, apesar de ter convicções socialistas talvez fosse pretensão catalogá-lo em uma única escola historiográfica, gosto de utilizar diversas fontes em minhas pesquisas e por vezes navegar entre as diversas escolas historiográficas existentes, até mesmo porque por vezes elas se fundem.

 7- Qual a forma mais adequada para utilizar em sala de aula as novas tecnologias? O seu desenvolvimento está provocando um avanço na educação escolar? 

No mundo cada vez tecnológico, tanto alunos quanto professores devem estar preparados para o manuseio de aparelhos tecnológicos não apenas para o divertimento, a melhor forma de utilizar estes aparelhos e ferramentas tecnológicas em minha visão dever ser feita através de um estudo prévio do profissional de educação, elas precisam ser utilizadas como ferramentas complementares no processo de ensino e aprendizado principalmente nas séries iniciais.

A respeito do avanço na educação escolar vejo de três prismas diferentes, o primeiro na educação de básica, no ensino universitário e de divulgação científica. 

É um trabalho árduo uma vez que como citado acima, camadas mais pobres da população não possuem acesso a estas tecnologias e muitas destas as encaram como um objeto de consumo e não ferramenta de ensino e ou aprendizado.

Na educação básica, onde a maiorias das crianças brasileiras não possuem acesso direto a microcomputadores e outras formas de acesso rápido a tecnologia, a inserção gradual acredito ser o melhor caminho, devido inclusive ao despreparo de muitos docentes no que diz respeito à utilização destas novas mídias no processo lúdico pedagógico e no processo de ensino-aprendizado. 

Em nível técnico e universitário, acredito que cursos chamados como semipresenciais mostram-se aos poucos formas eficientes na busca do conhecimento o que não significa que o papel do professor seja dispensável, pelo contrario é cada vez mais imprescindível e devemos estar preparados para estes novos tempos onde à educação caminha a passos largos a se tornar democrática, assim o professor terá uma necessidade de se tornar um profissional dinâmico e atento a todas as formas de mediação de conhecimento. 

No que diz respeito à divulgação e o acesso a trabalhos científicos as novas mídias facilitaram muito o trabalho dos pesquisadores, facilitou-se a troca de experiências e a divulgação de trabalhos científicos e acadêmicos de uma forma geral.

Muitos sites iniciaram um processo de digitalização de diversas mídias e trabalhos acadêmicos que dificilmente a maioria dos pesquisadores teria acesso a eles o que possibilitou a inserção destas fontes em diversos trabalhos que tiveram como base de pesquisa estas fontes digitalizadas. Devemos primar, no entanto para que não se viole os direitos autorais.

8- Pensando sobre a história resultado de pesquisas científicas, qual a importância da América Latina para a história europeia ?

A história da América Latina é marcada pela presença europeia em seu território desde o final do séc. XV, desde então se inicia um processo de dominação de território e cultural onde os nativos aos poucos foram forçados a deixar de lado seus hábitos culturais diversos e tornarem-se “europeus - novos”.

Os motivos que levaram os europeus a colonizar este continente são diversos que vão desde a procura por riquezas passando por fugas e migrações forçadas.
A importância do “Mundo Novo” historicamente para o “Antigo Mundo” pode ser encontrada em distintas e interligadas linhas de pesquisa, se levar em conta a crise econômica europeia do final do séc. XV e inicio do séc. XVI, a ascensão burguesa a América Latina deu uma sobrevida e prolongaram riquezas de algumas monarquias europeias tudo isto ao custo da morte de milhões de nativos e de Africanos e seus descendentes trazidos as Américas como força motriz do trabalho braçal escravocrata das colônias aqui estabelecidas.

Como o passar dos tempos a América passa ser palco de disputa entre diversas nações europeias, todas visando explorar as riquezas naturais existentes em terras americanas de forma geral.
De grosso modo durantes séculos a América Latina serviu de fonte de riquezas as elites europeias, mesmo custando à vida da maioria de seus povos e de grupos étnicos trazidos de forma violenta da África para servirem de mão-de-obra-escrava nos mais diversos meios de produções.

Em história é um problema grave usar a subjetividade, entretanto me arriscaria a dizer que a história europeia teria tomado outro rumo caso não tivesse obtido êxito na exploração Americana.

9- Agradeço a atenção dispensada e paciência para responder estas perguntas. Deixe um recado aos leitores!

Gostaria inicialmente a oportunidade de dialogar sobre assuntos tão pertinentes.

Aos leitores espero que a leitura deste diálogo tenha sido proveitosa e satisfatória, estou a disposição para um bate-papo futuro sobre assuntos diversos, como diria Paulo Freire. “Não existem saberes melhores ou piores, existe saberes diferentes”.

Aos amigos do GEA Cipriano Barata, meus mais sinceros agradecimentos pela oportunidade e fico a disposição para futuras trocas de experiência e debates.





Mais informações a respeito do trabalho de Rafael Camargo.

Link para seu currículo acadêmico :http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4835128T6

Alguns links sobre seu trabalho, produções, entrevistas, reportagens etc...

Artigos Publicados em jornais :

Pedagogia e museologia. Jornal Expressão, Julio de Castilhos RS, 10 jan. 2014. 
 O Patriarca dos Castilhos. Jornal Expressão, 29 jul. 2011.
Um pouco da história nesses 120 anos de Julio de castilhos. Regional Águas da Serra, 13 jul. 2011
Museu Vila Rica. Jornal Expressão, Julio de Castilhos RS, 24 jun. 2011.
 Uma pequena fonte, grandes histórias. Jornal Expressão, Julio de Castilhos RS, 10 jun. 2011.
A convenção 110 anos. Jornal Expressão, Julio de Castilhos RS, 03 jun. 2011.
 Novela e futebol. Jornal Plural, Cruz Alta RS, p. 04 - 04, 01 mar. 2011.
Clube Felix da Cunha 110 anos. Regional Águas da Serra, Julio de Castilhos RS.



Sobre o Autor:
Rafael Freitas
Rafael Freitas. Graduado em História na FAPA, Membro Permanente e fundador do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata. Tem interesse de pesquisa em História Social da América e Tendências Pedagógicas Contra-hegemônicas. Produtor e radialista do programa "História em Pauta" na web rádio La Integracion. Colunista no jornal "A Folha" de Alvorada, RS.

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