Isso mesmo, você não leu errado. Já que o homem referenciado nos livros escolares apenas como o destacado articulador político que ganhou a alcunha de “Patriarca da Independência” foi muito mais do que isso. Por mais que, ironicamente, seja muito pouco conhecido aqui no Brasil, todo o legado que ele emprestou à ciência mundial.
Por mais que no cenário internacional, suas incontáveis contribuições no campo da mineralogia, metalurgia, biologia, geologia e química sejam bem mais divulgadas. A tal ponto, que em outros países, segundo Carlos Cornejo, autor de “Minerais e Pedras Preciosas no Brasil”, mais comumente se lembra do cientista José Bonifácio e não do poderoso ministro que dominou o governo brasileiro entre 1822 e 1823.
Tanto que, por exemplo, a quem não saiba, não é mera coincidência o nome dado ao mineral andradita, ou andradite (minério do tipo granada, composto de cálcio e ferro), com o nome de José Bonifácio de ANDRADA. Uma vez que, em 1868, o geólogo James Dwight Dana (1813-1895), em reconhecimento a todo o vasto trabalho realizado na área por este grande cientista brasileiro, lhe homenageia com o seu nome dado a esta pedra.
José Bonifácio |
Afinal, sem as pesquisas deste homem que, entre nós é mais lembrado como um dos mais influentes políticos do I Reinado Brasileiro (1822-1931), talvez o elemento mineral lítio nunca viesse a ser descoberto. Mas além deste metal alcalino de incontáveis usos na indústria hoje, outros três minerais totalmente inéditos, igualmente chegaram ao nosso conhecimento graças aos seus estudos.
Nos quais também acabaram reveladas diversas variedades de outros elementos já conhecidos. Como quando esteve na Suécia e na Noruega, descrevendo 12 novos minerais, antes de voltar à Universidade de Coimbra (Portugal), em 1800. O aluno que retornava agora como professor já sendo reconhecido em todo o continente europeu.
Contribuições estas que se tornam ainda mais significativas, ao vermos que, de acordo com os professores de física, Adilson Marques (da UFRJ) e Carlos Lombardi Filgueiras (da UFMG) em uma publicação no ano de 2009, José Bonifácio de Andrada é o “único brasileiro ligado à descoberta de um novo elemento químico” (Revista Nova Química na Escola, no. 31, p. 253).
Ou melhor, novos elementos por ele descobertos, podendo desde já destacar também a criolita (minério de sódio, alumínio e flúor). O qual ele anunciou ao mundo em um artigo que, já neste mesmo ano de 1800 teria uma versão dele traduzida na França e no ano seguinte, outra na Inglaterra. Assim como a afisita (ou turmalina preta) e a wernerita (ou escapolita, um mineral de origem metamórfica) que ele assim a denominou em referencia a Abraham G. Werner (1749-1817) fundador da moderna mineralogia.
Dois dentre os muitos minérios relacionados à vida e obra do cientista Andrada e Silva.
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Contribuições que o historiador Jorge Caldeira tem plena certeza de que se tivessem ocorrido nos dias atuais, teriam dado a José Bonifácio o Prêmio Nobel (“José Bonifácio de Andrada e Silva”, Coleção “Fundadores do Brasil”).
O que nos faz se perguntar por que todo este referencial não é mais divulgado em nosso país. Justo numa sociedade como a nossa que tanto precisa instigar o interesse pela pesquisa científica nas atuais e futuras gerações. Uma lacuna que podemos ajudar a preencher elencando as várias produções bibliográficas que este iluminista construiu ao longo de sua vida acadêmica.
Tais como: “Sobre as minas de carvão-de-pedra em Portugal” (1813), “Memória minerográfica da serra que decorre de Santa Justa até Santa Comba e suas vizinhanças na província do Minho” (1814-15), “Memória sobre a nova mina de ouro da outra banda do Tejo, chamada Príncipe Regente” (1817), “Memória minerográfica sobre o distrito metalífero entre os rios Alva e Zêzere”, “Memória sobre as pesquisas e lavra dos veios de chumbo de Chacim, Souto, Ventozello, e Villar de Rey na província de Trás-os-Montes” (1818).
Além dos outros campos de conhecimento em que este paulista da cidade de Santos também se destacou. Como por exemplo, seus estudos sobre as propriedades da planta quina (Cinchona calisaya) que as divulgou em seu “Experiências químicas sobre a quina do Rio de Janeiro, comparada com outras”, no ano de 1814. Trabalho que faz dele o primeiro fitoquímico brasileiro.
Ocorrendo que o seu pioneirismo também se percebe na ecologia. Pois é, justo num tempo que a preocupação com o meio ambiente era algo distante na mentalidade da maioria das pessoas. Uma vez que, de acordo com Jorge Caldeira, o primeiro trabalho científico de José Bonifácio a ser publicado, era um em que tratava da preservação das baleias.
Sobre isso então valendo comentar outras duas publicações suas neste sentido: “Há terrenos que pelo arado não dão fruto, mas sendo cavados com o picão sustentam mais do que se fossem férteis” (1813) e “Sobre a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal, particularmente de pinhais nos areais de beira-mar; seu método de sementeira, custeamento e administração” (1815).
Todos esses trabalhos realizados antes do mesmo tomar frente no governo imperial do Brasil em 1822. O que não quer dizer que sua fase intelectual chegara ao fim. Quando o mais certo seria dizer que ela passa da fase do estudo para a da aplicação. Já que de acordo com uma entrevista dada em 2001 à revista Época, o historiador José Augusto Pádua destacou a importância de José Bonifácio para as questões ambientais, quando já todo envolvido nas questões do poder.
Afirmando que, em 1823, ele já previa a falta de chuvas que poderia ocorrer se os montes e as encostas fossem sendo escalvados diariamente, de acordo com palavras do próprio Andrada e Silva. Uma visão que até nos convida a querer entender um pouco mais do “Patriarca” político, mais controverso, objeto de opiniões bem mais conflitantes sobre a sua ação à frente do Brasil após a sua emancipação.
Onde, contudo, não há como negar que poucos gestores públicos em nosso país, nesta época, tinham visão suficiente para encarar lutas pela introdução de progressos, como ele o fez. Tais como o uso de vacinas, do sistema métrico e da meteorologia.
Logo, analisar aspectos sobre o político José Bonifácio merece espaço em outro momento. Para deste modo não ofuscar a visão aqui contemplada do estudioso que a própria terra ainda não valoriza como o deveria. Dado que o seu legado nas ciências se sobressaiu muito mais do que as suas questões do poder (estas sim que o fizeram ser muito mais exaltado até agora). Então que o exponhamos.
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