Pensando
o período eleitoral, é comum o sentimento de euforia ou mesmo desânimo, diante
do resultado obtido. No caso da esquerda, o segundo, vem prosperando
insistentemente. A partir daí, o segundo passo mais corriqueiro é acreditar que
temos que nos organizar para “daqui 2 anos”, para novamente esperar a
triunfante vitória eleitoral da esquerda.
Minha
análise primária é de que, mesmo estando mais munida de teoria política,
experiência histórica e energia, boa parte da esquerda, insiste em cair nas
mesmas armadilhas analíticas e práticas, que estrangulam nosso campo. Quando
falo de esquerda, trato do campo em geral, em suas hegemonias. Falo não só de
partidos, mas de uma certa base fiel que se identifica com o campo. Penso que
está se errando na forma como se analisa as eleições no geral, seja na forma ou
no objetivo.
Vale
citar que essa é uma análise inicial e simplificada, propositalmente. Minha
intensão não é dar respostas, indiretas ou diretas à ninguém, mas de alguma
forma, colaborar com o debate eleitoral que é sempre necessário. É uma conversa
interna para a esquerda. Convido a seguirmos o debate nos comentários. Não se
trata de uma carta-cobrança, nem manual de comportamento. São não mais que
reflexões que propositalmente desejo compartilhar.
Enfim,
algumas notas para tomar:
- A
ESQUERDA NÃO É UMA DÁDIVA NEM O POVO É BURRO: uma das primeiras reações e
talvez uma das mais vistas nesse pós-eleição é a que afirma coisas como “o povo
é burro”, “a cidade X tem o prefeito que merece”, “vocês têm mais é que se
fuder”, e por ai vai. Precisamos urgentemente compreender que esquerda e
direita são conceitos pouco claros, não-homogêneos, e vazios de significado
(inclusive para a esquerda eu diria). Então para as pessoas em geral, esquerda
não é sinônimo de muitas das pautas que parecem ser, como garantia de direitos
ou defesa dos trabalhadores. Daí temos que saber que as eleições são,
inclusive, espaços de debate de programa. Sim, precisamos meticulosamente
construir, discutir, aprofundar e apresentar didaticamente os nossos programas.
Não basta uma estrela e uma foice para conseguir votos. Muito menos tem
efetividade debates impositivamente setoriais, embora sejam extremamente
importantes, mas por si só não garantem votos ou apoios, principalmente no
executivo. No legislativo, candidaturas temáticas ainda se saem bem, e vêm
ganhando espaço. Mas se queremos falar de governar cidades, estados ou o país,
teremos quer estar preparados para tratar de forma objetiva de problemas
diversos e ao mesmo tempo emergenciais da maioria da população, que é a classe
trabalhadora. Não entrarei profundamente aqui no tipo de programa, pois esse é
um texto para a esquerda em geral. Mas o fato é que nenhuma pessoa é obrigada a
amar a esquerda por que achamos que é o melhor caminho. Essa aliás, é uma
postura extremamente soberba e confortável, que terceiriza a culpa.
- QUAL
O PROJETO DA ESQUERDA: aqui é uma questão extremamente importante. Venho
debatendo a necessidade de compreendermos as diferenças que existem no campo da
esquerda. Essa compreensão é fundamental para avançarmos em qualquer tipo de
debate que possa conjugar as forças do campo. Do contrário, estaremos apenas
reproduzindo arremedos de programas baseados em ideiais da social-democracia de
conciliação, como se isso fosse a única alternativa possível para “resistir”. O
que chamamos de esquerda, é um conjunto de ideias e posicionamentos, que
inclusive divergem em vários pontos. Via-de-regra, o que ganha espaço na
esquerda geral (pessoas que se identificam com o campo, mas não possuem
essencialmente uma identidade política bem definida) é o projeto que tem mais
chances de ganhar. Mas que projeto é esse? Ele realmente da conta de derrotar o
avanço do retrocesso social? Ou é uma forma melhorada de administrar, com
políticas austeras mais humanizadas, submetidas à lógica capitalista? Não há
problema em ser um bom social democrata, mas é importante o fazer de forma
consciente.
- OS
LIMITES DA DEMOCRACIA BURGUESA: esse é um ponto difícil. Boa parte da análise
pós-eleitoral que toma o campo da esquerda, acaba se confundido com as próprias
eleições, como se elas fossem por si, a própria expressão da política moderna.
Sou dos comunistas que acredita na importância de disputar as eleições com um
bom programa. Mas em hipótese alguma, podemos nos deixar cair da armadilha da
democracia burguesa. A democracia burguesa, essa que conhecemos hoje, não
guarda a expressão única da democracia. Ela é extremamente limitada, e possui
regras bem definidas para que sejam eleitos projetos que atendam aos interesses
do poder econômico. Muitas vezes acabamos assumindo essa “ideologia”, como se
as regras fossem o próprio objeto. Por isso que é fundamental analisar a
conjuntura política para além de quem governa as regiões. Boa parte da esquerda
deixa se levar pela defesa quase moralista de “instituições”, que na prática
não atendem a nenhum interesse popular. A esquerda no geral, principalmente a
eleitoralmente mais expressiva, sequer tensiona a democracia burguesa, quando,
muitas vezes, não acaba se beneficiando dela. Precisamos retomar uma análise
mais ampla da política. É o primeiro passo para entender as abstenções e o
decréscimo de nossos votos. Se as pessoas estão fugindo disso que insistimos em
chamar de democracia, por que nós estamos tão presos a ela? Será que assim não
nos confundimos com ela? Repito, não se
trata de negar o papel das eleições, mas de extrapolar as eleições como
objetivo fim. Mas que nunca precisamos entender que a vitória da direita e
construída no hegemonismo cultural do Capitalismo.
-
ESQUEÇA O POBRE DE DIREITA: outra alegação comum é a falta de consciência de
classe. Amigos, o velho barbudo foi bem claro quando tratou do tema.
Consciência de classe é algo que se constrói, com trabalho de base e política
cotidiana. Consciência de classe é pensamento contra hegemônico. Não é um bônus
automático que vem no contra-cheque da firma. Pelo contrário, lembrem-se “as
ideias dominantes de cada época, são as ideias de classe dominante”. Portanto o
caminho é justamente o anti-moralismo. E se ao invés de textos como se
pudéssemos cobrar política e apelidos pejorativos como “pobre de direita”, não
libertamos nosso irmão de classe, ou será que somos incapazes? Essa ideia
repete o erro clássico do autoritarismo e da soberba sobre um pensamento de
esquerda.
- A
POLÍTICA NÃO ACABA AQUI: por fim, parece óbvio, mas não é. Não podemos deixar
para aparecer nas próximas eleições, daqui 2 anos, como paladinos da boa
política. O combate é diário, planejado e cansativo. Mas é necessário, se
quisermos de fato consolidar o caminho do progresso social. É hora de se
organizar! Construa a luta em um partido, trabalhe em uma associação, um
sindicato. Se não for possível, se experimente na organização popular, nem que
seja na sua rua, no seu condomínio. “Mas eu sou de esquerda cotidianamente...”.
Consumo consciente e gentileza não são o suficiente. É por isso que se chama
luta de classe e não estilo de vida. Não há construção da esquerda somente na
sua vida particular, fora da construção coletiva, planejada e articulada. Vejam
o tamanho da tarefa: criar consciência e tomar o poder aos trabalhadores.
Certamente não se faz em 2 anos com bons candidatos. Mobilize!
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