RESENHA DE LIVRO: A REVOLUÇÃO BRASILEIRA DE CAIO PRADO JÚNIOR

Livro: A revolução brasileira

Autor: Caio Prado Júnior

Editora: Brasiliense

Ano: 1977

Edição:

RESENHA

A política revolucionária no Brasil, durante a Primeira República, tinha como ideias hegemônicas as que compunham o socialismo libertário, a exemplo do anarco-sindicalismo.  Com a derrota da greve geral impulsionada pelos anarquistas de SP em 1917, e da Insurreição popular  que se seguiu após uma grande greve ocorrida no ano seguinte, desta vez  no Rio de Janeiro, ambas com participação ativa de Astrojildo Pereira, surgiu uma novidade, o anarco-bolchevismo, até chegar a uma nova ideia revolucionária: o marxismo-leninismo. Com o passar do tempo, Astrojildo e Octávio Brandão, lideram a passagem do anarquismo para o comunismo, na esquerda revolucionária brasileira. O marxismo brasileiro forma-se dentro do contexto latino-americano. O PCB tem seu primeiro estatuto copiado do estatuto do PC argentino, e suas teorizações se encaixam nas ideias gerais do pensamento marxista da América do Sul.

Essa obra clássica da historiografia brasileira que rompe com toda a tradição marxista latino-americana, é a tese congressual denominada “A revolução brasileira” do comunista Caio Prado Júnior, que transforma-se em livro publicado pela editora Brasiliense, pela primeira vez em 1966.

A obra inicia com uma reflexão do filósofo Sócrates “Nosce te ipsum” (conhece a ti mesmo), como um convite para  a interpretação das especificidades do Brasil, como um primeiro passo para sua transformação. O livro teve sua primeira edição os seguintes textos: “A revolução brasileira”, “A teoria da revolução brasileira”, “A realidade econômica brasileira”, “Aspectos sociais e políticos da revolução brasileira”, “Programa da revolução brasileira”, “O problema político da revolução” e “A revolução e o antiimperialismo”. Na edição número cinco, tem um adendo denominado “A revolução brasileira” (respostas à crítica feita por Assis Tavares, que foram de alto nível e muito elogiada por Caio Prado) e “Perspectiva em 1977”.

Para Caio Prado, a revolução é um processo histórico, que inclui reformas, e o Brasil se encontrava, à época de escrita da tese, em face ou na eminência de uma revolução socialista. No entanto, essa revolução, não tem previsão, nem data e hora marcada para acontecer, mas será possibilitada pela práxis com objetivos claros, sem disfarces. Nesse caso, o autor não levava em conta que o país vivia uma ditadura empresarial-militar, quando as ações revolucionárias deviam de fato manterem-se ocultadas, por questão de sobrevivência dos lutadores sociais.

A tese tem como premissa que a teoria revolucionária consagrada, continha concepções  abstratas que atrapalhavam as ações políticas no país, permitindo que o golpe de primeiro de abril fosse dado sem resistência da classe trabalhadora. O âmago do erro teórico, para Caio Prado, é a ideia – totalmente estranha para Marx e Engels- de que a evolução histórica de todas as sociedades seguiriam o modelo universal europeu. Esse paradigma consagrado, não levaria em conta as especificidades do Brasil, entre elas, a existência de populações indígenas e suas culturas. O principal culpado desse engano seria o "Bureau Sulamericano da Internacional Comunista" que fez generalizações apressadas e enganosas, transpostas  pelos comunistas brasileiros, sem críticas. Portanto, conceitos como “latifúndio”, “restos feudais ou semi-feudais”, “camponeses”, “burguesia nacional”, “burguesia compradora”, como eram usadas, não teriam qualquer validade. A revolução brasileira deveria sim, levar em conta fatos históricos como independência política do Brasil, supressão do tráfico africano, imigração de trabalhadores europeus e abolição do trabalho escravo. Fatos todos eles, brasileiros.

Outro elemento contido na tese “A revolução brasileira” é o sistema colonial vigente no sistema econômico brasileiro desde sua formação, sendo considerado enquanto a raiz do desequilíbrio crônico da nossa finança externa. Contrariando noções correntes na esquerda do tempo de Caio Prado, ele avaliou que o aprofundamento das relações capitalistas não resultaram em melhorias nas condições de vida da classe trabalhadora brasileira. Caio Prado explica que categorias como “capitalismo burocrático” e “burguesia ortodoxa”, por outro lado, serviriam mais adequadamente para  a sua interpretação do Brasil nas vésperas do golpe de 1964, mas sempre  relacionando todo conceito adequado para interpretação do Brasil com as suas heranças coloniais..

Outros trechos da obra, mostram que o imperialismo no Brasil possui peculiaridades, em comparação com as ações imperialistas ocorridas na Ásia e na África, no nosso país a dominação imperialista atuou ao longo de toda a formação e evolução histórica. A luta antiimperialista, no entanto, deverá ser contra o sistema, não contra pessoas e com xenofobia. A colonização do território que seria chamado de Brasil, foi como uma parte e peça de um sistema mercantil internacional, não sendo capitalista, como afirmam maus entendedores dos escritos do historiador paulista. Ora, mercantilismo e capitalismo são diferentes, como são distintos o socialismo e o comunismo. 

Contrariando a defesa, inclusive de seu partido, de que o foco nas lutas no campo, deveriam ser pela reforma agrária, para Caio Prado, a grande exploração não deveria ser destruída, mas sim transformada pela eliminação de seus aspectos negativos, como a redução dos trabalhadores rurais às miseráveis condições materiais, culturais e sociais. Ainda sobre o processo revolucionário no campo, ele deve ser direcionado para elevar os padrões sociais da população trabalhadora rural e também mobilizar esses trabalhadores, apressando a sua organização sindical (que significa educar e habilitar para a luta).

Como partes de um programa visando a revolução brasileira, é indispensável o monopólio estatal do comércio exterior, e supressão completa da transferência ao exterior de lucros e remunerações diversas das empresas estrangeiras que operam no Brasil. Essas são duas das medidas para a economia brasileira deixar de ser colonial e passar a ser nacional.

Essas são algumas das principais ideias presentes na tese congressual transformada em livro "A revolução brasileira". Caio Prado Júnior, nessa obra, teve êxito em combater o eurocentrismo e teleologia na historiografia brasileira, ao escrever esse texto visando mudar as teses de seu partido, onde ele sempre militou, o Partido Comunista Brasileiro- PCB. Foi vitorioso, já que o partido reconhece hoje os méritos desse grande intérprete revolucionário do Brasil, assim como os historiadores sérios e comprometidos com a pesquisa histórica americana.

CONFIRA TRECHOS DO LIVRO: 


 




 Sobre o autor:


 
Rafael Freitas: Historiador. Membro Permanente e fundador do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata. Produtor e apresentador do programa "História em Pauta", que já passou por rádios comunitárias de Porto Alegre e Alvorada. Colunista no Jornal de Opinião (do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Alvorada- SIMA) e no Jornal de Viamão.

 

 

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