RESENHA DE LIVRO: "Mastodontes" de Joshua Freeman

Livro: Mastodontes: A história da fábrica e a construção do mundo moderno.

Autor: Joshua B. Freeman

Editora: Todavia

Ano: 2019


O historiador estadunidense Joshua B. Freeman aborda de forma clara e objetiva as origens e a evolução de uma das instituições mais emblemáticas do capitalismo e da modernidade: a fábrica. Dos tempos da revolução industrial inglesa do século XVIII até o atual momento da Divisão Internacional do Trabalho, as fábricas são retratos de seu tempo. Nelas que milhares de trabalhadores deixavam sua força de trabalho e sua mais-valia, produzindo uma infinidade de produtos, de automóveis a tecidos. 

O livro traz as origens das fábricas, ao longo dos séculos XVIII e XIX, na Inglaterra e nos Estados Unidos - em ambos os países, as visões de mundo elaboradas a partir da construção das fábricas são radicalmente diferentes; bem como a forma de exploração da mão de obra. Freeman também aborda o papel das fábricas e indústrias na União Soviética e no Bloco Socialista. O livro é concluído com uma análise histórica das gigantescas fábricas na China e Vietnam, que produzem itens para conhecidas marcas multinacionais, tais como Apple e Nike - em condições de trabalho nem sempre adequadas. 

Um livro inovador, talvez único em buscar as origens e desenvolvimento das fábricas (mastodontes). 

Trechos do livro:

"No discurso popular e na ideologia dominante hoje, a Revolução Industrial é frequentemente associada à liberdade individual e ao que se chama de livre mercado. Mas nos primeiros anos do sistema fabril podia ser tanto considerada uma nova forma de escravidão quanto uma nova forma de liberdade. Joseph Livesey, famoso editor de jornal e ativista da temperança, filho de um dono de fábrica, escreveu sobre os aprendizes que viu durante sua infância: 'Eles eram aprendizes de um sistema que não apresenta analogia com nada além da escravidão nas Índias Ocidentais'." (página 42).

" As fábricas cresceram sob um regime político autocrático, pelo menos no que dizia respeito a eles [os trabalhadores]. Os trabalhadores não tinham direito de votar, de se reunir, de se unir para negociar coletivamente com seus patrões, de deixar o emprego quando quisessem ou de dizer o que pensavam. Nada simboliza melhor o apoio que o Estado dava ao sistema industrial emergente do que o enforcamento de trabalhadores não pelo crime de atacar pessoas, mas objetos inanimados, como máquinas." (página 56).

"As fábricas estilo Waltham-Lowell encontraram uma solução brilhante no recrutamento de mulheres jovens da zona rural da Nova Inglaterra. Solteiras, ainda na adolescência ou juventude, proporcionavam uma força de trabalho bem instruída, acostumada a ver e a realizar trabalho árduo e a ser subserviente à autoridade masculina, mas não tão vital para a família que sua retirada provocasse uma crise econômica ou social. E, para o deleite dos donos das fábricas, elas constituíam uma força de trabalho rotativa. Quando ficavam infelizes ou as fábricas careciam de trabalho, podiam voltar para a família em vez de ficar por perto e causar problemas, evitando o descontentamento e a desordem que surgiram na Inglaterra com a criação de um proletariado permanente." (página 74).

"Mas a Segunda Guerra Mundial possibilitou que o movimento trabalhista americano completasse a sindicalização da indústria de grande escala. Mesmo antes dos Estados Unidos entrarem no conflito, o crescimento da indústria de defesa reviveu a economia, reforçando os mercados e fortalecendo a confiança dos trabalhadores." (página 176).

"Se trabalho infantil, excesso de horas, uso de produtos químicos tóxicos, repressão aos sindicalistas e coisas semelhantes acontecessem dentro das instalações de uma empresa de marca, sua imagem - seu ativo mais importante - poderia ser prejudicada.  Mas, se os problemas pudessem ser atribuídos a um terceirizado ao longo da cadeia de fornecimento, o dano seria menos dispendioso e mais facilmente contido. Tanto a Nike quanto a Apple conseguiram sobreviver com danos no longo prazo incrivelmente pequenos a revelações sobre condições de trabalho e tratamento dos trabalhadores nas fábricas que faziam seus produtos, culpando os subcontratados, prometendo melhor supervisão e mais transparência e emitindo novos códigos de conduta" (página 295).

"A fábrica gigante foi fundamental tanto para o desenvolvimento capitalista quanto para o socialista, não apenas do ponto de vista econômico, mas também social e político. Ela nunca é a mesma dentro de diferentes culturas e sistemas sociais, mas suas características essenciais mostraram-se notavelmente estáveis e duradouras, uma vez que percorreram o mundo, instalando-se em lugares que pareciam o completo oposto uns dos outros. Não é uma característica do capitalismo, e sim da modernidade, em todas as suas variações." (página 320).



Sobre o autor:

 
Fábio Melo: Historiador. Membro Permanente e fundador do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata (GEACB). Pesquisa sobre História Social da América e Educação. Produtor e radialista do programa "História em Pauta", que já passou por rádios comunitárias de Porto Alegre e Alvorada. Professor de História e Geografia. Tem diversos textos escritos sobre educação, cultura e política.
















Um comentário:

  1. Pertinente temática. Que assim sendo diante da complexidade q aborda há de se considerar outros fatores como ocorre hoje em dia ainda no "chão de fabrica", como a automatização/robotização tecnológica e as novas formas/categorias de trabalho no seio do proletariado contemporâneo que são os chamados "executivos", que são "novas profissões/cargos", cujo esses trabalhadores não se consideram "peões" proletários, no sentido das lutas de classes históricas...

    ResponderExcluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...